Ryzy Advocacia

Quando o arrematante passa a ter direito aos aluguéis e arrendamento? A partir da assinatura do auto de arrematação.

A partir da assinatura do auto de arrematação, regularmente firmada pelo Juiz, pelo leiloeiro e pelo arrematante, transfere-se a titularidade do bem imóvel arrematado, bem como os direitos relativos à posse (indireta), permitindo o uso, gozo e fruição do bem.

1. Introdução: o leilão, a confiança e o advogado como guardião da segurança jurídica

Imagine o cenário: um empresário, após cuidadosa análise patrimonial, decide participar de um leilão judicial. Avalia riscos, projeta rendimentos e deposita, no ato da arrematação, não apenas o valor ofertado, mas também suas legítimas expectativas de retorno econômico. Nesse momento, o auto de arrematação lavrado pelo Estado-Juiz, não é apenas um documento; é a pedra angular que sustenta o equilíbrio entre a eficácia da execução e a segurança jurídica do adquirente.

Sob a ótica do Direito, trata-se de negócio jurídico forçado, de natureza originária, que extingue o domínio do executado e o transfere ao arrematante, conferindo-lhe as prerrogativas inerentes à propriedade, inclusive o jus fruendi, ou seja, o direito de perceber os frutos civis do bem, aluguéis/arrendamento, rendas e proveitos que dele se extraem, observados os meios legais para efetivar a posse direta.

Contudo, o caminho entre o leilão e a fruição tranquila dos frutos nem sempre é linear. Expropriados que resistem em entregar as chaves, locatários e arrendatários que seguem pagando ao antigo proprietário, contratos obscuros ou mesmo a exploração econômica direta pelo devedor, desafiam a própria autoridade do ato expropriatório, exigindo medidas judiciais para resguardar o direito do adquirente. É nesse ponto crítico que o trabalho técnico do advogado se torna não apenas útil, mas essencial.

Por meio de notificações extrajudiciais, requerimentos administrativos, ações propostas de forma estratégica, o advogado se posiciona como verdadeiro fiador da higidez do ato judicial. Auxiliando na transferência do domínio para que se concretize não apenas formalmente, mas com toda a sua eficácia econômica, protegendo o adquirente de prejuízos que poderiam desfigurar o próprio instituto da arrematação.

Assim, a cada auto de arrematação firmado, o Poder Judiciário confia ao arrematante o fruto legítimo do processo executivo. E é a advocacia, atuando com técnica e prudência, que transforma essa confiança estatal em realidade patrimonial tangível, garantindo que o novo proprietário possa gozar, sem embaraços, dos direitos que a lei e a sentença lhe conferem.

2. A arrematação judicial como forma originária de aquisição da propriedade

Sob o prisma jurídico, a arrematação consubstancia-se em modalidade de alienação forçada, resultante da atividade estatal expropriatória no âmbito do processo executivo. Nos termos do art. 903, caput, do Código de Processo Civil, com a assinatura do auto de arrematação pelo Juiz, pelo leiloeiro e pelo arrematante, aperfeiçoa-se o ato expropriatório, operando-se de pleno direito a transferência do domínio do bem imóvel, independentemente do posterior registro imobiliário, este restrito à eficácia erga omnes.

Trata-se, pois, de modo originário de aquisição da propriedade, na medida em que rompe o liame jurídico anterior, extinguindo o direito real do executado e constituindo novo título dominial em favor do arrematante, livre de ônus pessoais que não acompanhem o bem por força de lei. Tal natureza é reiteradamente reconhecida pela doutrina especializada. Marcelo Abelha assevera que:

O auto de arrematação devidamente assinado é título de propriedade em favor do arrematante, somente se revelando necessária a expedição da respectiva carta para, marcando o término da expropriação forçada, proceder ao registro da alienação no Registro de Imóveis e, assim, trasladar a propriedade sobre o bem arrematado
(Manual de Execução, 7. ed., Forense, p. 460).

Do mesmo modo, Humberto Theodoro Júnior leciona que o auto de arrematação assume a feição de verdadeiro título de domínio em sentido material, operando imediata mutação subjetiva na titularidade do direito real sobre o bem alienado judicialmente (cf. Processo de execução e cumprimento de sentença, p. 557-558).

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça solidificou entendimento na mesma linha, reconhecendo expressamente que:

Com a assinatura do auto de arrematação, operam-se plenamente os efeitos do ato de expropriação em relação ao executado e ao arrematante, independentemente de registro imobiliário, o qual se destina a consumar a transferência da propriedade com efeitos em face de terceiros.
(STJ, REsp 1.536.888/GO, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 24/05/2022)

Esse caráter originário da arrematação garante ao arrematante não apenas o domínio do bem, mas também a plenitude dos direitos que dele irradiam, uso, gozo e disposição, ex vi do art. 1.228, §1º, do Código Civil. Por conseguinte, a partir da assinatura do auto, extingue-se a titularidade do executado, o qual perde, inclusive, a legitimidade para a percepção dos frutos civis decorrentes do bem, tais como alugueres e rendas.

Este arcabouço normativo e jurisprudencial confere à arrematação judicial a imprescindível segurança jurídica, elemento essencial para fomentar a participação de adquirentes em hasta pública, resguardando a efetividade do processo executivo e, em última análise, assegurando o adimplemento do crédito exequendo.

3. O momento em que nasce o direito do arrematante sobre os frutos civis: eficácia imediata do auto de arrematação

A discussão acerca do exato instante em que o arrematante passa a ter legitimidade para perceber os frutos civis do imóvel, como por exemplo alugueres e arrendamento, foi amplamente enfrentada pela jurisprudência e pela doutrina, consolidando-se em sentido claro: o direito do arrematante nasce com a assinatura do auto de arrematação pelo juízo da execução, pelo leiloeiro e pelo próprio adquirente, independentemente do registro da carta de arrematação no fólio real ou mesmo da imissão formal na posse.

3.1. Fundamento normativo

Esse entendimento se ancora diretamente no art. 903 do Código de Processo Civil, que dispõe:

“Art. 903. Assinado o auto de arrematação pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação considerar-se-á perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma de que trata o §4º.”

Corroborando, o art. 1.228, §1º, do Código Civil estabelece:

“O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa (…).”

Logo, uma vez consolidado o domínio em razão do ato judicial expropriatório, transmigram imediatamente ao arrematante todos os direitos inerentes à propriedade, bem como os direitos relativos à posse (indireta), incluindo o jus fruendi, que lhe assegura o direito exclusivo à percepção dos frutos civis.

3.2. Doutrina especializada

A doutrina igualmente prestigia a consumação imediata do direito do arrematante. Segundo Humberto Theodoro Júnior, a arrematação representa:

“título de domínio, em sentido material, do arrematante sobre os bens adquiridos na hasta pública, funcionando o auto como título em sentido formal.”
(Processo de execução e cumprimento de sentença, p. 557-558)

Fredie Didier Jr. e colaboradores salientam que:

“Tem o objetivo muito claro de, ao tornar definitiva a arrematação, prestigiar a segurança jurídica do arrematante e, com isso, estimular a aquisição do bem penhorado em leilão judicial.”
(Curso de direito processual civil: execução, p. 968)

3.3. Jurisprudência do STJ e TJPR: imediatidade dos efeitos

A jurisprudência consolidou o entendimento de que a assinatura do auto, por si só, transfere ao arrematante o direito de perceber os frutos civis, não sendo necessário aguardar o registro da carta de arrematação ou eventual imissão na posse. Destacam-se:

 Superior Tribunal de Justiça

  • REsp 1.536.888/GO:

“Com a assinatura do auto de arrematação, operam-se plenamente os efeitos do ato de expropriação em relação ao executado e ao arrematante, independentemente de registro imobiliário, o qual se destina a consumar a transferência da propriedade com efeitos em face de terceiros.”
(Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 24/05/2022).

  • CC 194.154/PE:

“A arrematação perfeita, acabada e irretratável decorre da assinatura do respectivo auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro (…), caracterizando título de propriedade em favor do arrematante, independentemente da expedição da carta.”
(Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 22/09/2023).

 Tribunal de Justiça do Paraná:

  • TJPR – 4ª C.Cível – Apelação Cível 0020833-61.2019.8.16.0031 (Guarapuava):

“Após a lavratura do Auto de Arrematação, e independentemente do Registro na Matrícula do bem adquirido, é que os aluguéis devem ser pagos ao arrematante.”
(Rel. Desª Maria Aparecida Blanco de Lima, j. 08/02/2024)

  • TJPR – 9ª C.Cível – AI 0105553-15.2023.8.16.0000 (Londrina):

“A assinatura do auto de arrematação transfere a titularidade do bem imóvel arrematado, bem como os direitos relativos à posse indireta, permitindo o uso, gozo e fruição do bem. Com a arrematação, o arrematante se sub-roga nos direitos do locador, cabendo ao primeiro os frutos da coisa, no caso, o valor dos aluguéis.”
(Rel. Juiz Subst. Guilherme Frederico Hernandes Denz, j. 03/03/2024)

  • TJPR – 15ª C.Cível – AI 0071787-39.2021.8.16.0000 (União da Vitória):

“O arrematante tem direito à percepção dos aluguéis desde a data de lavratura do auto de arrematação, não sendo preciso aguardar o registro no CRI.”
(Rel. Des. Jucimar NovoChadlo, j. 19/03/2022)

3.4. Convergência entre jurisprudência e finalidade da execução

A imediata atribuição do direito de percepção dos frutos civis ao arrematante preserva não só a segurança jurídica do ato expropriatório, mas também a função teleológica da execução, que visa satisfazer o crédito e efetivar a transferência patrimonial com todos os ônus e bônus do domínio.

Permitir que o expropriado continue a perceber os frutos do bem alienado equivaleria a subverter a lógica do processo executivo, acarretando enriquecimento sem causa e comprometendo a confiabilidade dos leilões judiciais como instrumentos legítimos de satisfação dos credores e aquisição segura pelos arrematantes.

4. A perda da legitimidade do expropriado para perceber frutos civis e o risco do enriquecimento sem causa

A partir da consumação do ato expropriatório, concretizado com a assinatura do auto de arrematação (art. 903 do CPC), extingue-se de maneira definitiva a titularidade dominial do executado, inclusive quanto às faculdades de usar, gozar e fruir o bem. Essa transferência não se restringe ao domínio nu, mas compreende o pleno jus fruendi, nos termos do art. 1.228, §1º, do Código Civil.

Trata-se de decorrência lógica da arrematação judicial enquanto forma originária de aquisição da propriedade, que rompe o vínculo anterior e estabelece novo polo subjetivo no direito real, deslocando integralmente a titularidade do bem, e de seus frutos, para o arrematante.

4.1. Precedentes que vedam a fruição de frutos pelo expropriado

A jurisprudência tem reiterado que a percepção de alugueres ou de qualquer outra modalidade de frutos civis pelo antigo proprietário após a assinatura do auto de arrematação carece de respaldo jurídico. Trata-se de situação que configura enriquecimento sem causa, vedado pelo art. 884 do Código Civil.

Nos autos do AI 0105553-15.2023.8.16.0000 (TJPR – 9ª C.Cível), ficou expressamente assentado que:

“Com a assinatura do auto de arrematação transfere-se a titularidade do bem, bem como os direitos relativos à posse indireta, permitindo ao arrematante o uso, gozo e fruição do bem. Assim, cabe ao arrematante a percepção dos frutos civis, não havendo necessidade de aguardar o registro imobiliário.”
(Rel. Juiz Subst. Guilherme Frederico Hernandes Denz, j. 03/03/2024)

De igual forma, a 4ª Câmara Cível do TJPR, no julgamento da Apelação Cível 0020833-61.2019.8.16.0031, concluiu que:

“Após a lavratura do Auto de Arrematação, independentemente do registro na matrícula, é o arrematante quem deve receber os alugueres, não havendo mais legitimidade do expropriado para tanto.”
(Rel. Desª Maria Aparecida Blanco de Lima, j. 08/02/2024)

No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, em precedente paradigmático (REsp 698.234/MT, Rel. Min. Raul Araújo), decidiu-se que a partir de formalizado o auto de arrematação, a transferência do direito à percepção dos frutos do imóvel locado passa a pertencer ao arrematante, independentemente do registro imobiliário. (DJe 30/04/2014)

E ainda, no REsp 833.036/SP, ressaltou-se:

“A transferência ao arrematante dos direitos de uso e fruição do imóvel locado prescinde de forma especial translatícia, bastando a formalização do auto.”
(Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 28/03/2011)

4.2. A vedação ao enriquecimento sem causa (art. 884 do CC)

A manutenção do recebimento de alugueres e arrendamento pelo expropriado após a consumação da arrematação visa preservar o equilíbrio patrimonial. A partir do momento em que o expropriado já não responde pelos encargos tributários futuros nem detém qualquer prerrogativa dominial, permitir-lhe a percepção dos frutos configuraria desequilíbrio flagrante, transferindo ao arrematante o ônus econômico da propriedade sem lhe assegurar a respectiva utilidade.

Essa distorção ao permitir ao expropriado a continuidade na percepção de aluguéis, arrendamento, frutos ou rendas oriundas do bem objeto da expropriação, quando este já não mais responde pelos até mesmo por tributos incidentes sobre o imóvel, tampouco detém qualquer poder de disposição, é subverter a lógica do processo executivo e a função social da arrematação.

4.3. Da vedação ao exercício arbitrário das próprias razões pelo arrematante

Por outro ângulo, não se pode perder de vista que a consolidação do domínio em favor do arrematante, com todos os direitos que dele irradiam, não autoriza o adquirente a valer-se de meios de força para obter a posse direta do bem, ou compelir terceiros à desocupação sem a observância do devido processo legal, o que reforça a necessidade de requisição judicial da imissão na posse, respeitando-se integralmente o devido processo legal.

Ainda que o arrematante faça jus ao uso, gozo e fruição do imóvel, inclusive à percepção dos frutos civis, desde a assinatura do auto de arrematação, bem como os direitos relativos à posse (indireta), a efetiva imissão na posse demanda provocação do Poder Judiciário, pela adoção das medidas assecuratórias cabíveis.

O Código Penal, em seu art. 345, tipifica o exercício arbitrário das próprias razões, vedando a prática de fazer justiça pelas próprias mãos, ainda que para satisfazer pretensão legítima. Assim, qualquer tentativa do arrematante de forçar a entrada ou desocupação do imóvel sem respaldo judicial poderá caracterizar ilícito penal, além de ensejar responsabilidade civil por eventuais danos.

No plano processual, o art. 536 do CPC confere ao Juízo a prerrogativa de fixar medidas executivas para cumprimento de suas decisões, inclusive com uso da força pública, quando necessário. Portanto, cabe ao arrematante, devidamente assistido por profissional habilitado, manejar os instrumentos processuais adequados para resguardar seu direito à posse e aos frutos do bem arrematado, evitando a autodefesa ilícita e protegendo a eficácia do próprio ato expropriatório.

Esse é mais um ponto que evidencia o quão relevante é o acompanhamento jurídico especializado em execuções com alienação forçada, não apenas para garantir a efetividade patrimonial do título de arrematação, mas também para orientar o adquirente quanto aos limites legais do exercício de seu direito, evitando que uma pretensão legítima se converta, inadvertidamente, em responsabilidade penal ou civil.

4.4. A imprescindibilidade da atuação advocatícia para resguardar o ato expropriatório

Esse contexto revela a importância da advocacia especializada não apenas na condução do procedimento executivo até a arrematação, mas, sobretudo, no resguardo das faculdades dominiais do arrematante. Isso se dá por meio de medidas processuais como:

  • Notificações extrajudiciais aos locatários e arrendatários, redirecionando o pagamento dos alugueres e arrendamentos;
  • Oposição técnica a ações, quando indevidamente propostas por suposta dúvida quanto a legitimidade das partes em perceber frutos;
  • Ações cautelares de sequestro dos frutos civis, para assegurar a preservação das receitas que legitimamente pertencem ao adquirente.

Esse plexo de estratégias jurídicas tem por finalidade não apenas garantir o direito subjetivo do arrematante, mas também preservar o instituto da arrematação judicial como mecanismo seguro de realização da propriedade e satisfação do crédito, mantendo intacta a confiança indispensável à participação nos leilões públicos.

5. Reflexos práticos para locatários e arrendatários: para quem devem pagar os alugueres e arrendamento?

A transferência da titularidade dominial do imóvel em hasta pública não repercute apenas na esfera jurídica do expropriado e do arrematante, mas também incide diretamente sobre o locatário, que se vê diante da necessidade de redirecionar os pagamentos dos alugueres e arrendamentos ao novo titular do direito real.

5.1. O dever do locatário em ajustar o cumprimento da obrigação

Nos termos do art. 290 do Código Civil, “cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor senão quando a este notificada”. Por simetria principiológica, a doutrina e a jurisprudência aplicam raciocínio equivalente nas situações de alienação forçada do imóvel locado: o locatário passa a ter a obrigação de pagar os alugueres ao novo proprietário, desde que regularmente cientificado do novo polo credor.

O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o tema em contexto semelhante, firmou que:

“Transferência ao Arrematante dos direitos de uso e/ou fruição do imóvel locado, que prescindem de forma especial translatícia, bem como do direito de obter a transferência do domínio, a qual condiciona-se ao registro de título. (…). o adquirente do imóvel sub-roga-se nos direitos decorrentes do contrato de locação relativo ao bem imóvel arrematado.(…).”
(STJ, REsp 833.036/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 28/03/2011)

O Tribunal de Justiça do Paraná, em diversas passagens extraídas dos processos que embasam este estudo, foi categórico ao reconhecer o dever do locatário de satisfazer o aluguel ao arrematante. Destaca-se o julgado no AI 0105553-15.2023.8.16.0000, onde restou consignado que:

“o arrematante tem o direito de receber os valores relativos ao aluguel a partir da lavratura do auto de arrematação, independentemente do registro imobiliário do título translativo.”
(TJPR – 9ª C.Cível, Rel. Juiz Subst. Guilherme Frederico Hernandes Denz, j. 03/03/2024)

5.2. A boa-fé do locatário e a excludente de responsabilidade

Conquanto o locatário esteja obrigado a redirecionar o pagamento dos alugueres, a sua responsabilidade fica mitigada quando demonstra boa-fé objetiva, isto é, quando não foi validamente notificado pelo arrematante acerca da arrematação e da necessidade de alteração do destinatário do pagamento.

Nesse ponto, a atuação preventiva do advogado do arrematante revela-se fundamental: ao diligenciar a notificação formal dos locatários, viabiliza o pleno exercício do jus fruendi, elimina a possibilidade de consignações fundadas em suposta dúvida legítima e afasta qualquer alegação futura de pagamento liberatório feito em favor do expropriado.

5.3. Consignação indevida e ônus da sucumbência

O manejo indevido de ações, alegando dúvida inexistente quanto ao legítimo credor dos alugueres, pode ensejar a improcedência do pleito e a condenação ao pagamento dos ônus sucumbenciais. O STJ, em recente precedente citado nos autos, consolidou que:

“deve-se levar em consideração não apenas a sucumbência, mas também ao princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do processo deve suportar as despesas dele decorrentes.”
(STJ – AgInt no REsp: 1757370 SC 2018/0198730-5, Relator.: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 21/02/2022, T1 – PRIMEIRA TURMA)

Portanto, do ponto de vista prático, o locatário deve observar:

  • A quem paga: após regularmente notificado, deve pagar exclusivamente ao arrematante;
  • Sob risco de repetição: pagamento realizado ao expropriado, ciente o locatário da transferência do domínio, poderá ser considerado ineficaz, sujeitando-o a nova cobrança pelo verdadeiro credor;
  • Eventual consignação: deve ter por base dúvida legítima, sob pena de ver reconhecida sua improcedência, com condenação em custas e honorários advocatícios.

5.4. Segurança jurídica da locação após a arrematação

Esse rearranjo obrigacional visa dar concretude ao princípio da boa-fé contratual (art. 422 do CC) e preservar a funcionalidade econômica dos contratos de locação, mas sem esvaziar o direito do arrematante, que passa a deter o jus fruendi ex lege. Nesse contexto, a advocacia qualificada atua não apenas para assegurar o imediato redirecionamento do pagamento dos alugueres, mas também para orientar locatários e prevenir litígios desnecessários, garantindo a estabilidade das relações obrigacionais em face das mutações dominiais.

6. Conclusão: preservação da confiança nos leilões judiciais e a imprescindibilidade do assessoramento jurídico especializado

Os leilões judiciais representam, no ordenamento jurídico brasileiro, um poderoso instrumento de realização do crédito e de circulação lícita de riquezas. Não por acaso, a arrematação judicial foi desenhada pelo legislador como forma originária de aquisição da propriedade, livre de ônus pessoais e apta a transferir ao adquirente todos os atributos do domínio, inclusive o jus fruendi, que compreende o direito à percepção dos frutos civis desde a assinatura do auto de arrematação (art. 903 do CPC e art. 1.228, §1º, do CC).

Contudo, esse mesmo sistema jurídico que prestigia a segurança do arrematante também impõe limites intransponíveis à autodefesa patrimonial. O exercício arbitrário das próprias razões, vedado pelo art. 345 do Código Penal, revela-se incompatível com a lógica do Estado de Direito. Assim, ainda que legitimado a usufruir economicamente do bem, o arrematante deve sempre buscar a desocupação pela via adequada, com segurança e respaldo legal, devendo valer-se exclusivamente das ferramentas processuais cabíveis.

Neste delicado equilíbrio entre o direito material e as restrições impostas pelo devido processo legal, o advogado especializado emerge como peça fundamental. Sua atuação não apenas garante a adoção das estratégias judiciais corretas para viabilizar o pleno gozo do bem arrematado, mas também resguarda o adquirente de riscos patrimoniais e pessoais que poderiam decorrer do desconhecimento dos limites legais para satisfação do próprio direito.

Ao longo deste estudo, verificou-se que o auto de arrematação, regularmente assinado pelo Juiz, pelo leiloeiro e pelo arrematante, não constitui mero ato formal do processo executivo, mas sim o marco jurídico que consolida a transferência do domínio do bem e projeta, imediatamente, os efeitos patrimoniais (posse indireta) da propriedade em favor do adquirente, inclusive o direito exclusivo à percepção dos frutos civis, como alugueres e rendas decorrentes da exploração do imóvel.

Tal compreensão, solidamente assentada na legislação processual (art. 903 do CPC), no Código Civil (art. 1.228, §1º) e na jurisprudência dos tribunais superiores, confere à arrematação o grau de segurança indispensável para fomentar a participação responsável nos leilões judiciais, preservando a integridade do sistema executivo e viabilizando a satisfação célere do crédito.

Todavia, esse ambiente de segurança jurídica não se estabelece por si só. A multiplicidade de interesses em jogo, do expropriado, do arrematante, dos locatários e mesmo de credores concorrentes, exige uma condução técnica apurada, desde a fase da hasta pública até a consolidação plena dos efeitos econômicos do ato expropriatório.

É nesse ponto que o assessoramento jurídico revela sua faceta mais valiosa: identificar previamente os riscos, estruturar notificações extrajudiciais, orientar locatários sobre a legitimidade do novo credor, manejar ações específicas (como o sequestro de frutos civis ou a contestação estratégica de consignações infundadas), e conduzir, com rigor técnico, o cumprimento integral do direito do arrematante ao uso e gozo da propriedade.

Em outras palavras, a atuação profissional habilitada não apenas mitiga eventuais litígios, mas potencializa o valor do investimento realizado em hasta pública, ao assegurar que o novo proprietário possa exercer, sem embaraços, todas as prerrogativas dominiais que o ordenamento jurídico lhe garante.

Assim, desde a assinatura do auto de arrematação, regularmente firmada pelo Juiz, pelo leiloeiro e pelo arrematante, transfere a titularidade do bem imóvel arrematado, bem como os direitos relativos à posse (indireta), permitindo o uso, gozo e fruição do bem. Não representando mero ato formal, mas o ponto exato em que se consolidam a transferência da propriedade e o nascimento do direito de perceber, desde logo, os frutos civis do bem, como alugueis, arrendamentos e demais receitas decorrentes de sua exploração econômica.

Nesse cenário, o papel do advogado especializado mostra-se determinante: é ele quem assegura que esse direito não fique apenas no papel, mas se converta efetivamente em receita para o arrematante. Trata-se, em última análise, de transformar o investimento realizado no leilão judicial em retorno econômico seguro, com respaldo legal e a tranquilidade que só o acompanhamento técnico pode proporciona.

Assessoria de imprensa

Ryzy Advogados Associados
OAB/PR 11.914

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